segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Reponho uma poesia do poemário A rosa é a via:


As rosas são breves

É breve a rosa,
todas as rosas são breves;
quatro letras de perfumes
que te consomem e sagram.
Apenas tenho rosa, esta palavra,
para cantar a tua brevidade

António Eduardo Lico
Uma poesia de Manuel Alegre (Praça da Canção):

LIBERDADE

Sobre esta página escrevo
teu nome que no peito trago escrito
laranja verde limão
amargo e doce o teu nome.

Sobre esta página escrevo
o teu nome de muitos nomes feito água e fogo lenha vento
primavera pátria exílio.

Teu nome onde exilado habito e canto mais do que nome: navio
onde já fui marinheiro
naufragado no teu nome.

Sobre esta página escrevo o teu nome: tempestade.
E mais do que nome: sangue. Amor e morte. Navio.Esta chama ateada no meu peito
por quem morro por quem vivo este nome rosa e cardo
por quen livre sou cativo.

Sobre esta página escrevo o
teu nome: liberdade.

domingo, 2 de dezembro de 2012

Uma canção de José Afonso, poema de Paulo Armando, música e voz José Afonso:


Reponho uma poesia do poemário A rosa é a via:


Cobre-me o corpo com rosas
Quando eu estiver no caixão,
Das mais lindas e viçosas,
Põe-mas sobre o coração.

(Poeta popular
Manuel da Silva Varejota, sitio dos Funchais,
freguesia de Querença, conselho de Loulé.)

Se o meu corpo pudesse cobrir as rosas
e ser-lhe o coração e o viço
e o alimento obscuro.

Se o meu corpo pudesse cobrir as rosas
todas as rosas, como se jardim fosse
e tivesse todas as rosas em mim.

Se o meu corpo pudesse cobrir as rosas
e as rosas fossem em mim
vida e morte, lenha e fogo.

Se o meu corpo pudesse cobrir as rosas
e ser como as rosas – o silêncio
ou o segredo de se morrer quando se abre.

António Eduardo Lico
Um soneto de Camões:


O cisne, quando sente ser chegada
A hora que põe termo à sua vida,
Harmonia maior, com voz sentida,
Levanta pela praia inabitada.

Deseja lograr vida prolongada,
E dela está chorando a despedida;
Com grande saudade da partida,
Celebra o triste fim desta jornada.

Assim, Senhora minha, quando eu via
O triste fim que davam meus amores,
Estando posto já no extremo fio,

Com mais suave acento de harmonia
Descantei pelos vossos desfavores
La vuestra falsa fe y el amor mio.

sábado, 1 de dezembro de 2012

Reponho uma poesia do poemário A rosa é a via:


Uma flor na névoa

Eras névoa quando nas manhãs
estendias, preguiçosa, as tuas pétalas.
Entre luz e sombra, entre noite e dia
eras fronteira invisível, um só ponto
de névoa imprecisa e tangível perfume
que esperava o meio-dia.

António Eduardo Lico
Canção da Ribeirinha ou Cantiga da Garvaia de Paio Soares de Taveirós, trovador da primeira metade do séc. XII. Durante muito tempo esta composição gozou do estatuto da mais antiga composição poética em galaico-português, perdendo esse estatuto para uma composição do trovador João Soares de Paiva:

No mundo nom me sei parelha,
mentre me for como me vai;
ca ja moiro por vós, e ai!,
mia senhor branca e vermelha,
queredes que vos retraia
quando vos eu vi em saia?
Mao dia me levantei,
que vos entom nom vi feia!

E, mia senhor, des aquelha,
me foi a mi mui mal di' ai!
E vós, filha de Dom Pai
Moniz, en bem vos semelha
d' haver eu por vós garvaia?
Pois eu, mia senhor, d' alfaia
nunca de vós houve nem hei
valia d'ua correia!

Uma transcrição (de entre muitas possíveis) para português actual:

No mundo não conheço outro como eu,
enquanto me acontecer como me acontece:
porque já morro por vós, e ai!,
minha senhora branca e vermelha,
quereis que vos censure
quando vos eu vi em saia? (em corpo bem feito)
Mau dia me levantei
que vos então não vi feia!

E, minha senhora, desde então,
passei muitos maus dias, ai!
E vós, filha de D. Paio
Moniz, parece-vos bem
ter eu de vós uma garvaia? (manto)
Pois eu, minha senhora, de presente
nunca de vós tive nem tenho
nem a mais pequenina coisa.