segunda-feira, 21 de maio de 2012

António Aleixo é o poeta de hoje.
Nascido em Vila Real de Santo António em 1899 e falecido em Loulé em 1949.
Foi pastor e cauteleiro.
Quando procuramos dados acerca do poeta, invariavelmente deparamos com a seguinte classificação: António Aleixo foi um poeta popular. Nada de mais errado. Ou se é poeta, ou não se é. E António Aleixo era poeta e era poeta até à medula dos ossos. Pouco importa se não conseguiu acabar a instrução escolar, e ser semi-analfabeto. O que deixou em poesia, fosse em quadras pu em outras formas poéticas é de relevo. Talvez para alguns (muitos) alguém semi-analfabeto não possa ser escritor, ou poeta. Felizmente não é assim.
Deixo alguns exemplos da arte de António Aleixo, que numa simples quadra era capaz de encaixar a situação mais complexa:



Forçam-me, mesmo velhote,
de vez em quando, a beijar
a mão que brande o chicote
que tanto me faz penar.

Eu não tenho vistas largas,
nem grande sabedoria,
mas dão-me as horas amargas
lições de filosofia.

À guerra não ligues meia,
porque alguns grandes da terra,
vendo a guerra em terra alheia,
não querem que acabe a guerra

Que importa perder a vida
em luta contra a traição,
se a Razão mesmo vencida,
não deixa de ser Razão?

P'ra mentira ser segura
e atingir profundidade,
tem que trazer à mistura
qualquer coisa de verdade.

Sei que pareço um ladrão...
mas há muitos que eu conheço
que, não parecendo o que são,
são aquilo que eu pareço.

O mundo só pode ser
melhor do que até aqui,
- quando consigas fazer
mais p'los outros que por ti!

Eu não sei porque razão
certos homens, a meu ver,
quanto mais pequenos são
maiores querem parecer.

Uma mosca sem valor
poisa, c'o a mesma alegria,
na careca de um doutor
como em qualquer porcaria.

Entre leigos ou letrados,
fala só de vez em quando,
que nós, às vezes, calados,
dizemos mais que falando.


Mentiu com habilidade,
fez quantas mentiras quis;
agora fala verdade
ninguém crê no que ele diz.

Quem nada tem, nada come;
e ao pé de quem tem de comer,
se alguém disser que tem fome,
comete um crime, sem querer

A arte em nós se revela
Sempre de forma diferente:
Cai no papel ou na tela
Conforme o artista sente

Quem prende a água que corre
É por si próprio enganado;
O ribeirinho não morre,
Vai correr por outro lado.

Embora os meus olhos sejam
Os mais pequenos do mundo,
O que importa é que eles sejam
O que os Homens são no fundo.

Vós que lá do vosso império
prometeis um mundo novo,
calai-vos, que pode o povo
qu'rer um mundo novo a sério.

O homem sonha acordado
Sonhando a vida percorre
E desse sonho dourado
Só acorda quando morre.








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