sábado, 30 de junho de 2012

Mais uma poesia de Este rio que corre sem águas:


Perfumes tangentes ao vinho

Vem de tão longe quanto os perfumes
e de tão fundo como corolas.
Abrasa-me o sangue nas veias
tinge-me os ossos de cor rubi:
vinho! Fonte de todas as flores


António Eduardo Lico
Hoje regresso a Fernando Pessoa, colocando a Saudação a Walt Whitman Escrita pelo heterónimo Álvaro de Campos:



Saudação a Walt Whitman 

Portugal-Infinito, onze de junho de mil novecentos e quinze...
Hé-lá-á-á-á-á-á-á!
De aqui de Portugal, todas as épocas no meu cérebro,
Saúdo-te, Walt, saúdo-te, meu irmão em Universo,
Eu, de monóculo e casaco exageradamente cintado,
Não sou indigno de ti, bem o sabes, Walt,
Não sou indigno de ti, basta saudar-te para o não ser...
Eu tão contíguo à inércia, tão facilmente cheio de tédio,
Sou dos teus, tu bem sabes, e compreendo-te e amo-te,
E embora te não conhecesse, nascido pelo ano em que morrias,
Sei que me amaste também, que me conheceste, e estou contente.
Sei que me conheceste, que me contemplaste e me explicaste,
Sei que é isso que eu sou, quer em Brooklyn Ferry dez anos antes de eu nascer, 
Quer pela Rua do Ouro acima pensando em tudo que não é a Rua do Ouro,
E conforme tu sentiste tudo, sinto tudo, e cá estamos de mãos dadas,
De mãos dadas, Walt, de mãos dadas, dançando o universo na alma.

Ó sempre moderno e eterno, cantor dos concretos absolutos,
Concubina fogosa do universo disperso,
Grande pederasta roçando-te contra a diversidade das coisas,
Sexualizado pelas pedras, pelas árvores, pelas pessoas, pelas profissões,
Cio das passagens, dos encontros casuais, das meras observações,
Meu entusiasta pelo conteúdo de tudo,
Meu grande herói entrando pela Morte dentro aos pinotes,
E aos urros, e aos guinchos, e aos berros saudando Deus!

Cantor da fraternidade feroz e terna com tudo,
Grande democrata epidérmico, contíguo a tudo em corpo e alma,
Carnaval de todas as acções, bacanal de todos os propósitos,
Irmão gémeo de todos os arrancos,
Jean-Jacques Rousseau do mundo que havia de produzir máquinas,
Homero do insaisissable do flutuante carnal,
Shakespeare da sensação que começa a andar a vapor,
Milton-Shelley do horizonte da Electricidade futura!
Íncubo de todos os gestos,
Espasmo pra dentro de todos os objectos-força,
Souteneur de todo o Universo,
Rameira de todos os sistemas solares...

Quantas vezes eu beijo o teu retrato!
Lá onde estás agora (não sei onde é mas é Deus)
Sentes isto, sei que o sentes, e os meus beijos são mais quentes (em gente)
E tu assim é que os queres, meu velho, e agradeces de lá —,
Sei-o bem, qualquer coisa mo diz, um agrado no meu espírito

Uma ereção abstrata e indirecta no fundo da minha alma.

Nada do engageant em ti, mas ciclópico e musculoso,
Mas perante o Universo a tua atitude era de mulher,
E cada erva, cada pedra, cada homem era para ti o Universo.

Meu velho Walt, meu grande Camarada, evohé!
Pertenço à tua orgia báquica de sensações-em-liberdade,
Sou dos teus, desde a sensação dos meus pés até à náusea em meus sonhos,
Sou dos teus, olha pra mim, de aí desde Deus vês-me ao contrário:
De dentro para fora... Meu corpo é o que adivinhas, vês a minha alma —
Essa vês tu propriamente e através dos olhos dela o meu corpo —
Olha pra mim: tu sabes que eu, Álvaro de Campos, engenheiro,
Poeta sensacionista,
Não sou teu discípulo, não sou teu amigo, não sou teu cantor,
Tu sabes que eu sou Tu e estás contente com isso!

Nunca posso ler os teus versos a fio... Há ali sentir demais...
Atravesso os teus versos como a uma multidão aos encontrões a mim,
E cheira-me a suor, a óleos, a actividade humana e mecânica.
Nos teus versos, a certa altura não sei se leio ou se vivo,
Não sei se o meu lugar real é no mundo ou nos teus versos,

Não sei se estou aqui, de pé sobre a terra natural,
Ou de cabeça pra baixo, pendurado numa espécie de estabelecimento,
No tecto natural da tua inspiração de tropel,
No centro do tecto da tua intensidade inacessível.

Abram-me todas as portas!
Por força que hei de passar!
Minha senha? Walt Whitman!
Mas não dou senha nenhuma...
Passo sem explicações...
Se for preciso meto dentro as portas...
Sim — eu, franzino e civilizado, meto dentro as portas,
Porque neste momento não sou franzino nem civilizado,
Sou EU, um universo pensante de carne e osso, querendo passar,
E que há de passar por força, porque quando quero passar sou Deus!

Tirem esse lixo da minha frente!
Metam-me em gavetas essas emoções!
Daqui pra fora, políticos, literatos,
Comerciantes pacatos, polícia, meretrizes, souteneurs,
Tudo isso é a letra que mata, não o espírito que dá a vida.
O espírito que dá a vida neste momento sou EU!

Que nenhum filho da... se me atravesse no caminho!
O meu caminho é pelo infinito fora até chegar ao fim!
Se sou capaz de chegar ao fim ou não, não é contigo,
É comigo, com Deus, com o sentido-eu da palavra Infinito...
Prà frente!
Meto esporas!
Sinto as esporas, sou o próprio cavalo em que monto,
Porque eu, por minha vontade de me consubstanciar com Deus,
Posso ser tudo, ou posso ser nada, ou qualquer coisa,
Conforme me der na gana... Ninguém tem nada com isso...
Loucura furiosa! Vontade de ganir, de saltar,
De urrar, zurrar, dar pulos, pinotes, gritos com o corpo,
De me cramponner às rodas dos veículos e meter por baixo,
De me meter adiante do giro do chicote que vai bater,
De ser a cadela de todos os cães e eles não bastam,
De ser o volante de todas as máquinas e a velocidade tem limite,
De ser o esmagado, o deixado, o deslocado, o acabado,
Dança comigo, Walt, lá do outro mundo, esta fúria,
Salta comigo neste batuque que esbarra com os astros,
Cai comigo sem forças no chão,
Esbarra comigo tonto nas paredes,
Parte-te e esfrangalha-te comigo
Em tudo, por tudo, à roda de tudo, sem tudo,
Raiva abstracta do corpo fazendo maelstroms na alma...

Arre! Vamos lá prà frente!
Se o próprio Deus impede, vamos lá pra frente... Não faz diferença...
Vamos lá prà frente sem ser para parte nenhuma
Infinito! Universo! Meta sem meta! Que importa?

(Deixa-me tirar a gravata e desabotoar o colarinho.
Não se pode ter muita energia com a civilização à roda do pescoço ...)
Agora, sim, partamos, vá lá prà frente.

Numa grande marche aux flabeux-todas-as-cidades-da-Europa,
Numa grande marcha guerreira a indústria, o comércio e ócio,
Numa grande corrida, numa grande subida, numa grande descida
Estrondeando, pulando, e tudo pulando comigo,
Salto a saudar-te,
Berro a saudar-te,
Desencadeio-me a saudar-te, aos pinotes, aos pinos, aos guinos!

Por isso é a ti que endereço
Meus versos saltos, meus versos pulos, meus versos espasmos
Os meus versos-ataques-histéricos,
Os meus versos que arrastam o carro dos meus nervos.

Aos trambolhões me inspiro,
Mal podendo respirar, ter-me de pé me exalto,
E os meus versos são eu não poder estoirar de viver.

Abram-me todas as janelas!
Arranquem-me todas as portas!
Puxem a casa toda para cima de mim!
Quero viver em liberdade no ar,
Quero ter gestos fora do meu corpo,
Quero correr como a chuva pelas paredes abaixo,
Quero ser pisado nas estradas largas como as pedras,
Quero ir, como as coisas pesadas, para o fundo dos mares,
Com uma voluptuosidade que já está longe de mim!

Não quero fechos nas portas!
Não quero fechaduras nos cofres!
Quero intercalar-me, imiscuir-me, ser levado,
Quero que me façam pertença doída de qualquer outro,
Que me despejem dos caixotes,
Que me atirem aos mares,
Que me vão buscar a casa com fins obscenos,
Só para não estar sempre aqui sentado e quieto,
Só para não estar simplesmente escrevendo estes versos!

Não quero intervalos no mundo!
Quero a contigüidade penetrada e material dos objetos!
Quero que os corpos físicos sejam uns dos outros como as almas,
Não só dinamicamente, mas estaticamente também!

Quero voar e cair de muito alto!
Ser arremessado como uma granada!
Ir parar a... Ser levado até...
Abstracto auge no fim de mim e de tudo!

Clímax a ferro e motores!
Escadaria pela velocidade acima, sem degraus!
Bomba hidráulica desancorando-me as entranhas sentidas!

Ponham-me grilhetas só para eu as partir!
Só para eu as partir com os dentes, e que os dentes sangrem
Gozo masoquista, espasmódico a sangue, da vida!

Os marinheiros levaram-me preso,
As mãos apertaram-me no escuro,
Morri temporariamente de senti-lo,
Seguiu-se a minh'alma a lamber o chão do cárcere privado,
E a cegarrega das impossibilidades contornando o meu acinte.

Pula, salta, toma o freio nos dentes,
Pégaso-ferro-em-brasa das minhas ânsias inquietas,
Paradeiro indeciso do meu destino a motores!

He calls Walt:
Porta pra tudo!
Ponte pra tudo!
Estrada pra tudo!
Tua alma omnívora,
Tua alma ave, peixe, fera, homem, mulher,
Tua alma os dois onde estão dois,
Tua alma o um que são dois quando dois são um,
Tua alma seta, raio, espaço,
Amplexo, nexo, sexo, Texas, Carolina, New York,
Brooklyn Ferry à tarde,
Brooklyn Ferry das idas e dos regressos,
Libertad! Democracy! Século vinte ao longe!
Pum! pum! pum! pum! pum!
PUM!

Tu, o que eras, tu o que vias, tu o que ouvias,
O sujeito e o objecto, o activo e o passivo,
Aqui e ali, em toda a parte tu,
Círculo fechando todas as possibilidades de sentir,
Marco miliário de todas as coisas que podem ser,
Deus Termo de todos os objectos que se imaginem e és tu!
Tu Hora,
Tu Minuto,
Tu Segundo!
Tu intercalado, liberto, desfraldado, ido,
Intercalamento, libertação, ida, desfraldamento,
Tu intercalador, libertador, desfraldador, remetente,
Carimbo em todas as cartas,
Nome em todos os endereços,
Mercadoria entregue, devolvida, seguindo...
Comboio de sensações a alma-quilómetros à hora,
À hora, ao minuto, ao segundo, PUM!

Agora que estou quase na morte e vejo tudo já claro,
Grande Libertador, volto submisso a ti.

Sem dúvida teve um fim a minha personalidade.
Sem dúvida porque se exprimiu, quis dizer qualquer coisa
Mas hoje, olhando para trás, só uma ânsia me fica —
Não ter tido a tua calma superior a ti-próprio,
A tua libertação constelada de Noite Infinita.

Não tive talvez missão alguma na terra.

Heia que eu vou chamar
Ao privilégio ruidoso e ensurdecedor de saudar-te
Todo o formilhamento humano do Universo,
Todos os modos de todas as emoções
Todos os feitios de todos os pensamentos,
Todas as rodas, todos os volantes, todos os êmbolos da alma.

Heia que eu grito
E num cortejo de Mim até ti estardalhaçam
Com uma algaravia metafisica e real,
Com um chinfrim de coisas passado por dentro sem nexo.

Ave, salve, viva, ó grande bastardo de Apolo,
Amante impotente e fogoso das nove musas e das graças, 
Funicular do Olimpo até nós e de nós ao Olimpo.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Mais uma poesia de Este rio que corre sem águas:


Junto de um rio...o obituário das palavras...

Quem ousa calar os deuses
colocando-lhe na boca
palavras que não sabem?
Nadando rente à margem
o peixe, nem sabe
que existem palavras líquidas
que secam lábios
quando os percorrem.
Peixes e deuses
ignoram palavras;
mudos e perdidos
em líquidas moradas
vivem sós, sem esperar
uma só e desoladora
palavra.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é Georg Traki.
Nascido em 1887 e falecido em 1914, Traki é talvez o maior expoente da poesia expressionista alemã. Dado a excessos, consumia desde jovem grandes quantidades de cocaína e ópio, daí ter morrido jovem, 27 anos.
A angústia e a subjectividade da vivência interior face à vivência exterior são marcas dua sua poesia.
Fica este poema com tradução de Cláudia Cavalcanti:



Aos Emudecidos

Oh, a loucura da cidade grande, quando ao entardecer
Árvores atrofiadas fitam inertes ao longo do muro negro
Que o espírito do mal observa com máscara prateada;
A luz, com açoite magnético, expulsa a noite pétrea.
Oh, o repicar perdido dos sinos da tarde.

A puta, em gélidos calafrios, pare uma criança morta.
A cólera de Deus chicoteia enfurecida a fronte do possesso,
Epidemia purpúrea, fome que despedaça olhos verdes.
Oh, o terrífico riso do ouro.

Mas quieta em caverna escura sangra muda a humanidade,
Constrói de duros metais a cabeça redentora.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Mais uma poesia de Este rio que corre sem águas:


Parti-me em flores...

Parti-me em flores
e não perdi, ou venci.
As pétalas apodreceram,
os perfumes voaram
nos ventos do Outono.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é Friedrich Nietzsche.
Nascido em 1844 e falecido em 1900, Nietzsche foi filólogo e filósofo, deixando também obra poética, incluida nos seus escritos..
Fica este poema:

As Minhas Rosas

Sim! a minha ventura quer dar felicidade;
Não é isso que deseja toda a ventura?
Quereis colher as minhas rosas?
Baixai-vos então, escondei-vos,
Entre as rochas e os espinheiros,
E chupai muitas vezes os dedos.
Porque a minha ventura é maligna,
Porque a minha ventura é pérfida.
Quereis apanhar as minhas rosas?

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Mais uma poesia de Este rio que corre sem águas:


Os rios são as lágrimas dos que choram...

Os rios são as lágrimas dos que choram
porque sabem que as fontes não podem secar
e cabe aos rios levar dores e mágoas
para os grandes mares; lá onde o sal
atinge o branco e dores e mágoas
podem voltar, como palavras.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é Dereck Walcot.
Nascido em 1930 em Santa Lúcia, Walcot é poeta e dramaturgo. A sua obra reflecte a natureza caribenha, quer física, quer espiritual.
Foi galardoado com o Prémio Nobel da Literatura em 1992.
Fica este poema:


Dark August

So much rain, so much life like the swollen sky
of this black August. My sister, the sun,
broods in her yellow room and won't come out.

Everything goes to hell; the mountains fume
like a kettle, rivers overrun; still,
she will not rise and turn off the rain.

She is in her room, fondling old things,
my poems, turning her album. Even if thunder falls
like a crash of plates from the sky,

she does not come out.
Don't you know I love you but am hopeless
at fixing the rain ? But I am learning slowly

to love the dark days, the steaming hills,
the air with gossiping mosquitoes,
and to sip the medicine of bitterness,

so that when you emerge, my sister,
parting the beads of the rain,
with your forehead of flowers and eyes of forgiveness,

all with not be as it was, but it will be true
(you see they will not let me love
as I want), because, my sister, then

I would have learnt to love black days like bright ones,
The black rain, the white hills, when once
I loved only my happiness and you.

terça-feira, 26 de junho de 2012

Mais uma poesia de Este rio que corre sem águas:


Dai-me tanta água, quanta precise...

Dai-me tanta água, quanta precise,
para que nunca o orvalho se esgote
e a mais humilde flor
possa sempre fazer florir
o seu próprio amanhecer


António Eduardo Lico
O poeta de hoje, e é a segunda vez que o coloco neste espaço, é António Ramos Rosa, com esta poesia:

Estar Só é Estar no Íntimo do Mundo

Por vezes cada objecto se ilumina 
do que no passar é pausa íntima
entre sons minuciosos que inclinam
a atenção para uma cavidade mínima
E estar assim tão breve e tão profundo
como no silêncio de uma planta
é estar no fundo do tempo ou no seu ápice
ou na alvura de um sono que nos dá
a cintilante substância do sítio
O mundo inteiro assim cabe num limbo
e é como um eco límpido e uma folha de sombra
que no vagar ondeia entre minúsculas luzes
E é astro imediato de um lúcido sono
fluvial e um núbil eclipse
em que estar só é estar no íntimo do mundo

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Mais uma poesia de Este rio que corre sem águas:


Caligrafia

A minha caligrafia íntima
nunca escreveu versos
metafísicos.
Seguramente, filósofos
com vocação de estetas
e que sempre seguram candeias
e vestem mantos verdes
dirão detectar pequenas
partículas esotéricas
na caligrafia que vos apresento.
E assim sendo, está provado
quanticamente.
A minha letra mais íntima
não a escrevo; desenho-a
no ar; espero que caia
mansamente e se desvaneça
sem metafísica.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é Francisco de Quevedo.
Nascido em 1580 e falecido em 1645, Quevedo é um dos expoentes do século de ouro da literatura de Espanha.
Com uma craiação literária abundante e vida turbulenta, que politicamente quer socialmente, manteve uma rivalidade acesa e acérrima com Góngora, ao qual dedicou muitas das suas sátiras.
A sua obra literária abarca todos os géneros literários da sua época, Quevedo cultivou a poesia, o ensaio filosófico, teatro, novela.
Fica este poema:

Túmulo de la mariposa


Yace pintado Amante,
De amores de la Luz muerta de amores,
Mariposa elegante
Que vistió rosas y voló con flores;
Y codicioso el fuego de sus galas
Ardió dos primaveras en sus alas.

El aliño del prado
Y la curiosidad de Primavera
Aquí se han acabado,
Y el Galán breve de la Cuarta Esfera
Que con dudoso y divertido vuelo
Las lumbres quiso amartelar del Cielo.

Clementes hospedaron
A duras Salamandras llamas vivas;
Su vida perdonaron,
Y fueron rigurosas, como esquivas,
Con el galán idólatra que quiso
Morir como Faetón, siendo Narciso.

No renacer hermosa,
Parto de la ceniza y de la muerte,
Como Fénix gloriosa
Que su linaje entre las llamas vierte,
Quien no sabe de amor y de terneza
Lo llamará desdicha, y es fineza.

Su tumba fue su Amada,
Hermosa sí, pero temprana y breve;
Ciega y enamorada,
Mucho al Amor y poco al Tiempo debe;
Y pues en sus amores se deshace,
Escríbase: Aquí goza, donde yace.

domingo, 24 de junho de 2012

Mais uma poesia de Este rio que corre sem águas:


Na margem de um rio, as horas são ainda mais absurdas

As horas são absurdas,
passam, e já não são,
sem deixar de o ser.
Um desconhecido esteta
clama na confluência
do Ser e Não Ser
que o Belo é absurdo
porque é belo em si mesmo,
indiferente ao tempo
e às horas que passam
e já não o são,
sem deixar de o ser.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é Mao Tse Tung, ou Mao Zedong na grafia actual.
Praticamente desconhecido como poeta, e mais conhecido pela sua actividade política revolucionária, e como fundador de República Popular da China. Amado e odiado, é sem matgem para dúvidas uma das figuras marcantes do século XX.
Alguns poetas ocidentais criticaram a sua poesia, tendo alguns mesmo, como Octavio Paz declarado que "era poeta medíocre". Não o creio, pois a sua poética é delicada e sensível.
Fica este poema, com tradução de Manuel Seabra:

ODE À FLOR DA AMEIXEIRA

para a melodia P'u Suan Tzu


(Sobre a 'Ode à Flor da Ameixeira'
de Lu Yu, com outro sentido)


O vento e a chuva despedem-se na Primavera
e a neve espera a sua chegada.
Já suspenso na encosta gelada
ramos floridos de grande beleza.


A sua beleza não vem desafiar a Primavera
mas apenas aguardar o seu regresso.
Espera que as flores da montanha estejam abertas
para entre elas sorrir alegremente.

sábado, 23 de junho de 2012

Mais uma poesia de Este rio que corre sem águas:


Nas margens, a Esfinge...

A Esfinge habita as margens
apenas como esfinge, de pedra,
absurdamente de pedra
impenetrável ao silêncio
que lhe vem de fora;
e vive, no entanto
em total mudez, na pedra
que lhe é externa,
só, contemplativa,
fazendo do tempo pedra,
só nas margens, sem esperar nada.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é João Cabral de Melo Neto.
Nascido em 1920 no Recife e falecido em 1999 no Rio de Janeiro, Melo Neto foi poeta e diplomata.
A sua poesia abarca um espectro largo - vai do surrealismo até às formas populares de poesia, mas toda ela temperada um grande rigor estético.
Fica este poema:



Tecendo a Manhã

1.
Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.

De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito de um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.

2.
E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.

A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.

sexta-feira, 22 de junho de 2012


Mais uma poesia de Este rio que corre sem águas:

Os rios sem águas são misteriosos

O láudano que corre como um rio
nos Hinos à Noite, subtil
e fino no traço que desenha.
Deuses loucos dançam na roleta
um pas de deux com Dostoiewski
e orvalhos cintilantes de luz
dançavam no eterno copo de vinho
que Hafez erguia na mão
como se fora uma rosa.
Regresso para dentro de mim mesmo
como rio que corre sem águas.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é Carlos Drummond de Andrade.
Nascido em 1902 em Itabira, Minas Gerais. Estudou e concluiu Farmácia; mas a sua vocação estava na escrita. Fundou Revista com outros escritores. Apesar da vida efémera foi um veículo poderoso de divulgação e afirmação do modernismo em Minas Gerais.
Faleceu no Rio de Janeiro em 1987.
Diga-se que o modernismo de Drummond de Andrade está ligado a uma aproximação objectiva e concreta do real, distinguindo-se da vertente mais subjectiva e lírica.
Fica este poema:


VERBO SER

Que vai ser quando crescer?
Vivem perguntando em redor. Que é ser?
É ter um corpo, um jeito, um nome?
Tenho os três. E sou?
Tenho de mudar quando crescer? Usar outro nome, corpo e jeito?
Ou a gente só principia a ser quando cresce?
É terrível, ser? Dói? É bom? É triste?
Ser; pronunciado tão depressa, e cabe tantas coisas?
Repito: Ser, Ser, Ser. Er. R.
Que vou ser quando crescer?
Sou obrigado a? Posso escolher?
Não dá para entender. Não vou ser.
Vou crescer assim mesmo.
Sem ser Esquecer.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Mais uma poesia de Este rio que corre sem águas:



Não consta que Zeus fosse versado em gramática...

Não consta que Zeus fosse versado em gramática
e em Roma quis ser conhecido como Júpiter,
quase como se fosse a quarta geração olímpica.
A gramática não é atributo divino.
Como ficas bem pairando sobre o Coliseu
hesitante entre Homero e Virgílio
e Afrodite banhando-se feliz no Tibre
ignorando que já era Vénus.
O enigmático Eneias, esse de Tróia
que a Musa quis de Roma fundador
e viajante teleológico, guiado por experimentado aedo
que já te conhecia o destino.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é Dalton Roque.
Nascido em 1935 em San Salvador e falecido, assassinado em 1975 em San Salvador.
Poeta, ensaísta, dramaturgo, jornalista, Roque Dalton foi assassinado pelos seu companheiro do Exército Revolucionário do Povo com acusações que mais tarde foram desmentidas.
A sua poesia, mantém-se plena de actualidade.
Fica esta poesia:



CANTO A NUESTRA POSICIÓN


A Otto Rene Castillo

Nos preguntan los poetas de aterradores bigotes,
los académicos polvorientos, afines de las arañas,
los nuevos escritores asalariados,
que suspiran porque la metafísica de los caracoles
les cubra la impudicia:
¿Que hacéis vosotros de nuestra poesía azucarada y virgen?
¿Qué, del suspiro atroz y los cisnes purísimos?
¿Qué, de la rosa solitaria, del abstracto viento?
¿En que grupo os clasificaremos?
¿En que lugar os encasillaremos?
Y no decimos nada.
Y no decimos nada.
Y no decimos nada.
Porque aunque no digamos nada,
los poetas de hoy estamos en un lugar exacto:
estamos
en el lugar en que se no obliga
a establecer el grito.
(Ah, como me dan risa los antiguos poetas
empecinados en vendarse los ojos
y en embadurnar de pétalos y de pajarillos famélicos
la giba del dolor anonadante
que se encarama sólida
encima del hombro positivo universal
desde el primer amanecer y el primer viento,
y que se olvidaron del hombre)
Estamos
en el lugar exacto que la noche precisa
para ascender al alba.
(Muchos poetas inclinaron sus insomnios antiguos
sobre la fácil almohada azul de la tristeza.
Construyeron ciudades y astros y universos
sobre la anatomía mediocre
de un nido de muñecas cristalinas
y exilaron la voz elemental
hasta planos altisimos, desnudos
de la raíz vital y la esperanza.
Pero se olvidaron del hombre.)
Estamos
en el lugar donde se gesta definitivamente
la alegría total que se atará a la tierra.
(Ay, poetas,
¿Cómo pudisteis cantar infamemente
a las abstractas rosas y a la luna bruñida
cuando se caminaba paralelamente al litoral del hambre
y se sentía el alma sepultada
bajo un volcán de látigos y cárceles,
de patrones borrachos y gangrenas
y oscuros desperdicios de vida sin estrellas?
Gritasteis alegría
sobre un hacinamiento de cadáveres,
cantasteis al plumaje regalón
y las ciudades ciegas,
a toda suerte de tísicas amantes;
Pero os olvidasteis del hombre).
Estamos
en el lugar donde comienza el astillero
que va a inundar los mares con sonrisas lanzadas.

(Ay, poetas que os olvidasteis del hombre,
que os ovidasteis
de lo que duelen los calcetines rotos,
que os olvidasteis
del final de los meses de los inquilinos,
que os olvidasteis
del proletario que se quedo en una esquina
con un bostezo eterno inacabado,
lleno de balas y sin sangre,
lleno de hormigas y definitivamente sin pan,
que os olvidasteis
de los niños enfermos sin jugetes,
que os olvidasteis
del modo de tragar de las mas negras minas,
que os olvidasteis
de la noche de estreno de las prostitutas,
que os olvidasteis de los choferes de taxi vertiginosos,
de los ferrocarrileros
de los obreros de los andamios,
de las represiones asesinantes
contra el que pide pan
para que no se le mueran de tedio
los dientes en la boca,
que os olvidasteis
de todos los esclavos del mundo,
ay, poetas,
¡como me duelen
vuestras estaturas inútiles!)

Estamos en el lugar en que se encuentra el hombre.
Estamos en el lugar en que se asesina al hombre,
en el lugar
en que los pozos mas negros se sumergen en el hombre.
Estamos con el hombre
porque antes muchísimo antes que poetas
somos hombres.
Estamos con el pueblo,
porque antes, muchísimo antes que cotorros alimentados
somos pueblo.
Estamos con una rosa roja entre las manos
arrancada del pecho para ofrecerla al hombre!
¡Estamos con una rosa roja entre las manos
arrancada del pecho para ofrecerla al hombre!
¡Estamos con una rosa roja entre las manos
arrancada del pecho para ofrecerla al Pueblo!
¡Estamos con una rosa roja entre las manos
arrancada del pecho para ofrecerla al Pueblo!

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Interrompo a edição de mais poesias do poemário The sentiment of a poet porque não tenho mais poemas terminados.
Assim inicício a publicação de poesias de outro poemário que também não está terminado e que designei Este rio que corre sem águas
Fica a primaira poesia, precisamente chamada ste rio que corre sem águas:


Este rio que corre sem águas

 Zeus era lúcido?
Ninguém acredita,
senão não seria uma divindade.
Quem, a não ser um louco
pode assumir a divindade?
Eu não a assumiria;
humildemente aceito
ter demasiada lucidez
e acreditar que os rios correm sem águas,
como o Caos corre sem matéria,
basta-lhe a Noite para correr
até que Céu e Terra se encontrem.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é René Char.
Nascido em 1907 e falecido em 1988, René Char. Aderiu ao grupo dos surrealistas e criou amizade com Paul Éluard, Aragon, Adré Breton e outros.
Combate na Resistência anti-nazi sob o nome de Capitaine Alexandre.
Afoasta-se do surrealismo a partir de 1938.
Fica este poema:



Le Marteau sans maître

Tu es pressé d'écrire,
Comme si tu étais en retard sur la vie.
S'il en est ainsi fais cortège à tes sources.
Hâte-toi.
Hâte-toi de transmettre
Ta part de merveilleux de rébellion de bienfaisance.
Effectivement tu es en retard sur la vie,
La vie inexprimable,
La seule en fin de compte à laquelle tu acceptes de t'unir,
Celle qui t'est refusée chaque jour par les êtres et par les choses,
Dont tu obtiens péniblement de-ci de-là quelques fragments décharnés
Au bout de combats sans merci.
Hors d'elle, tout n'est qu'agonie soumise, fin grossière.
Si tu rencontres la mort durant ton labeur,
Reçois-là comme la nuque en sueur trouve bon le mouchoir aride,
En t'inclinant.
Si tu veux rire,
Offre ta soumission,
Jamais tes armes.
Tu as été créé pour des moments peu communs.
Modifie-toi, disparais sans regret
Au gré de la rigueur suave.
Quartier suivant quartier la liquidation du monde se poursuit
Sans interruption,
Sans égarement.

Essaime la poussière
Nul ne décèlera votre union.

terça-feira, 19 de junho de 2012

Mais um poema de The sentiment of a poet:





Never use the word dragon in a poem

Dragon is an horrific word to use in a poem.
I use it because I’m writing it
writing it, I’m using it
if I wasn’t using it, I wasn’t writing it
and dragons couldn’t exist in my poem.
I shouldn’t use the word “because”…
See, “dragon” and “because” in a poem…
I know what you all are thinking:
I should express like that:
voyons “dragon” and “because” in a poem…
and even worse I used the word “if”.
Don’t believe I am a esthete
or should I write aesthete?
Whatever I am, I write words, however
I’m not the sophist so much waited.
Silence is my speech, is my dragon,
a word I should avoid in a poem.
Never use the word dragon in a poem;
if use it, you have to write it,
and after? Your fate is becoming an aesthete
what inconvenient! Someone can think
you want to be the next Canterbury Archbishop.
Voyons a dragon or a Canterbury Archbishop
Are not enough esoteric to be on a poem;
If they are aesthetic examples, it is because
one is dragon the other archbishop
and both are unreal in a poem.
I didn’t wanted to finish in a sophistic mood,
this poem was intended to be lyric.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é Paul Celan.
Nascido em 1920 e falecido em 1970, Paul Celan é o nome literário de Paul Antschel. Romeno de fala alemã, acaba por se fixar em paris em em 1955 abtém a nacionalidade francesa.
A sua poesia reflecte a dura experiência dos campos de concentração alemães da 2ª Guerra, bem como o facto de Celan ser um judeu de língua alemã. A sua poesia depois torna-se mais críptica.
Fica este poema:



Lit de neige

Yeux, aveugles au monde, dans la faille du mourir : je viens,

pousse rude au cœur.

je viens.


Mur de l'abrupt, miroir de la lune. En bas.

(Lueur tachée de souffle. Sang strié.

Âme nuageuse qui encore une fois est proche d'une figure.

Ombre des dix doigts-enserrés)


Yeux, aveugles au monde

yeux dans la faille du mourir,

Yeux, yeux ;

Le lit de neige sous nous deux, le lit de neige.


Cristal sur cristal,

au temps profond emprisonné, nous tombons,

nous tombons et gisons et tombons,

et tombons :


Nous fûmes, nous sommes.

Nous sommes une chair avec la nuit,

à la lisière, à la lisière.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Mais uma poesia de The sentiment of poet:



A poem without whitewash

Here is the poem:
don’t ask me to use whitewash;
I carefully avoid that word
to avoid something I have to avoid:
aesthetic and all related products.

Mr Brown ignores all about
the use of whitewash in poetry
and judge Larkin as misogynistic
and wants to submit to x ray the Movement
to find Englishness and expose it.
Don’t be astonished if Mr Brown
states he read William Carlos William
in a course on Gaelic Literature.
Mr Brown hasn’t ever known Jupiter,
even he thinks he lives at Olympus
and ministers comes from his thigh

I interrupt myself!

here is the poem:
don’t ask me to use whitewash
and Mr Brown; at least simultaneously


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é Haroldo de Campos.
Nascido em 1929 em São Paulo e falecido em 2003 em São Paulo, Haroldo de Campos foi poeta, ensaísta e tradutor.
Com Décio Pignatari e Augusto de Campos, seu irmão fundam o Movimento Concretista em 1956. Depois da experiência da poesia concreta, Garoldo de Campos seguiu um caminho individual e  surgem as Transcriações de obras de autores comoHomero, Dante, Maiakovsli, Goethe e de alkguns textos bíblicos.
Fica este poema:




HIERÓGLIFO PARA MÁRIO SCHENBERG


o olhar transfinito do mário

nos ensina

a ponderar melhor a indecifrada

equação cósmica



cinzazul

semicerrando verdes

esse olhar

nos incita a tomar o sereno

pulso das coisas

a auscultar

o ritmo micro -

macrológico da matéria

a aceitar

o spavento della materia (ungaretti)

onde kant viu a cintilante lei das estrelas

projetar-se no céu interno da ética



na estante de mário

física e poesia coexistem

como asas de um pássaro -

espaço curvo -

colhidas pela têmpera absoluta de volpi



seu marxismo zen

é dialético

e dialógico



e deixa ver que a sabedoria

pode ser tocável como uma planta

que cresce das raízes e deita folhas

e viça

e logo se resolve numa flor de lótus

de onde

- só visível quando damos conta -

um bodisatva nos dirige seu olhar transfinito.



***

céu: pistilos

faíscas do sagrado
sob um ponteiro de diamante

escrever no vidro
sentenças de vidro

in
visíveis

domingo, 17 de junho de 2012

Mais uma poesia de The sentiment of a poet





To Walt Whitman

As a god before the gods and Olympus,
almost before the Logos
your word full of vegetable blood
drew leaves and chants
on desolated lands.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é e e cummings.
Nascido em 1894 am Cambridge, Massachusetts e falecido em 1962. Edward Estlin Cummings, era normalmente escrito como e e cummings pelos seus editores, para fazer jus ao pouco ortodoxo uso que o poeta dava à grafia, à sintaxe, à pontuação.
Poeta, ensaísta, dramaturgo e artista plático, cummings foi um dos principais inovadores da linguagem da linguagem da poesia e da literatura do século XX. Embora parte significativa da sua obra poética tenha sido escrita em moldes tradicionais - muitos dos seus poemas são sonetos, cummings é sem dúvida um nome fundamental na poesia do século XX.
Fica este poema:


Because I love you




(because i love you) last night

clothed in sealace
appeared to me
your mind drifting
with chuckling rubbish
of pearl weed coral and stones;

lifted,and (before my
eyes sinking) inward,fled;softly
your face smile breasts gargled
by death:drowned only

again carefully through deepness to rise
these your wrists
thighs feet hands

poising
to again utterly disappear;
rushing gently swiftly creeping
through my dreams last
night,all of your
body with its spirit floated
(clothed only in

the tide's acute weaving murmur

sábado, 16 de junho de 2012

Mais uma poesia de The sentiment of a poet:



Poets like to talk about shepherds

Give me flowers
give me wine
give me women
and I will transform worlds,
galaxies, the universe curvature,
and I will find a solution
for the Zenon paradox.

I know, as if was the fate,
I have to sing shepherds
even without a pastoral flute.

Far way, Vergilius, watches over
his shepherds, and the poets.
Maybe from an anonymous epicurean eye
shepherds will be born again, and poets
can rest in peace.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é Paulo Leminski.
Nascido em Curitiba em 1944 e falecido em Curitiba em 1989, foi poeta, tradutor, crítico literário, professor.
Autor de vasta produção literária, a poesia de Paulo Leminski brilha ainda depois da sua morte, com o rasto que os grandes poetas deixam.
Fica esta poesia:

Poetas Velhos


Bom dia, poetas velhos.
Me deixem na boca
o gosto dos versos
mais fortes que não farei.

Dia vai vir que os saiba
tão bem que vos cite
como quem tê-los
um tanto feito também,
acredite.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Mais uma poesia de Sentiment of a poet:


Long life to the Berlin Wall


Berlin Wall was a wall
with stones and cement;
now is dust and minerals
and a famous scholar swears
that Mr. Brown has a piece
between his office and the Parliament.
One day an american geographer
visited Berlin – his name J.F. Kennedy.
“Ich bin ein Berliner!” he told the crowd.
The crowd, thinking he was converting
to a grammarian, applauded.
This is the Berlin Wall history.
the one which can be stated in a poem.
All the rest is dust and minerals.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é E.M. de Melo e Castro.
Nascido em 1932 na Covilhã, poeta, ensaísta, crítico, professor e artista plástico, foi juntamente com Ana Hatherly expoente da poesia experimental e poesia concreta portuguesas.
Tendo iniciado a sua carreira profissional como engenheiro têxtil, quer na produção, quer no design, aos poucos optou pela literatura.
Melo e Castro e Ana Hatherly mantiveram uma ligação forte ao grupo que no Brasil estava ligado à poesia concreta.
Fica este poema:

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Início hoje a publicação de um poemário que está ainda no começo. Tem apenas 7 poemas completos e um oitavo ainda à espera de um final. Trata-se de um poemário escrito em inglês, e dei-lhe o título do primeiro poema: The sentiment of a poet





The sentiment of a poet

A poet drinks on the street
and millions of stars died
empty of their liquid fire.
Suddenly just a comet,
just one comet on the sky.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é José Saramago.
Nascido em 1922 na Azinhaga-Golegá e falecido em Lanzarote em 2010, foi poeta, romancista, jornalista, ensaísta, contista, dramaturgo.
Saramago publicou três livros de poesia: Os Poemas Possíveis em 1966, Provavelmente Alegria em 1970 e O Ano de 1993 em 1975.
Galardoado com vários prémios literários, entre eles o Nobel da Literatura em 1998 e o Prémio Camões.
Fica este poema:

Dulcineia
 Quem tu és não importa, nem conheces
O sonho em que nasceu a tua face:
Cristal vazio e mudo.
Do sangue de Quixote te alimentas,
Da alma que nele morre é que recebes
A força de seres tudo.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Com esta poesia termino o poemário Sombras luminosas. Foram 34 poesias, velhas de dois a três anos. Este projecto é o sexto que realizei e que editei neste blog.
Pensarei se começarei a colocar poesias de poemários que ainda estão em elaboração e em fase praticamente inicial, cada um dos projectos com poucos poemas.


Uma Luz na Alvorada

As veredas do fim do mundo
no queixume do primeiro anjo
esse querubim de doze asas.
Ainda não era Prometeu,
apenas luz e fogo a cada manhã.
Em ti permanece a eterna alvorada
como a primeira luz.


António Eduardo Lico
Ana Hatherly é a poetisa de hoje.
Nascida em 1929 no Porto, Ana Hatherly paralelamente à poesia cultivou as artes plásticas e ao cinema. Professora na Faculdade de Ciências Sicoais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.
Na poesia fez parte do grupo de poesia experimental nos anos 60 e 70.
Fica esta poesia:


A Felicidade é um Túnel
                      o domínio 
o erotismo do domínio 
                      do domínio irrisório 
                                                mas enorme 

submeter 
ver tremer 
ver o tremor do outro 

                     vencer 
                                  o gelo 
                                  o desdém 
                                                   veloz 

a felicidade é um túnel 

terça-feira, 12 de junho de 2012

Mais uma poesia de Sombras luminosas:





3 vezes um sinal

Era um sinal, ou um lamento?
O murmúrio antigo e inaudível
de um deus destronado
cansado da sua eternidade vã.


António Eduardo Lico
O poeta de hoje é Giacomo Leopardi.
Nascido em 1798 em Recanati e falecido em Nápoles em 1837 foi poeta, ensaísta, filósofo, dramaturgo, filólogo.
Verdadeiro ícone do Romantismo, Leopardi, era ao mesmo tempo clássico e romântico, por muito que isto custe a muito crítica afamado.
Fica este poema:

L'infinito


Sempre caro mi fu quest'ermo colle,
E questa siepe, che da tanta parte
De l'ultimo orizzonte il guardo esclude.
Ma sedendo e mirando, interminati
Spazi di là da quella, e sovrumani
Silenzi, e profondissima quïete
Io nel pensier mi fingo, ove per poco
Il cor non si spaura. E come il vento
Odo stormir tra queste piante, io quello
Infinito silenzio a questa voce
Vo comparando: e mi sovvien l'eterno,
E le morte stagioni, e la presente
E viva, e 'l suon di lei. Così tra questa
Immensità s'annega il pensier mio:
E 'l naufragar m'è dolce in questo mare.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Fugindo à regra, hoje vou colocar mais um poeta. Trata-se de Fernando Grade.
Nascido no Estoril em 1943, Fernando Grade é poeta, artista plástico. Foi um dos fundadores do Desintegracionsimo, um movimento poético surgido e,1964-65,
Fica este poema:



UMA RAPARIGA NA GRONELÂNDIA
OU JANTAREI O TEU CORPO SOBRE O GELO




Desenho de Fernando Grade



RAPARIGA sentada corpo torcido de neve ó ventre guloso
na última aldeia a mais triste e fria de todas
aquela onde a Gronelândia acaba
onde os seios ficam sempre pequenos
rapariga na Gronelândia sentada na neve e sonhando com a aldeia
ao fundo de todos os sonhos e todas as pernas
num arbusto à míngua de sol onde os seios ficam sempre pequenos
Rapariga de neve eis amanhã o dia que vem no meu sangue
que há milhares de anos está marcado com uma flor silvestre na minha agenda
amanhã hei-de jantar o teu corpo sobre o gelo
compassadamente como quem afaga os cabelos a uma prostituta

Depois inventarei uma colher de pau para o urso branco
talvez lhe chame irmão numa paisagem cheia de cordas e algum sangue
e descerei o rio à procura da cabana onde tenho um gesto novo para afagar os teus cabelos
rapariga na Gronelândia sentada onde a neve acaba
na última aldeia onde os seios ficam sempre pequenos
ventre de tripas geladas a contar uma história à sombra dos icebergues
sem saber que a esta mesma hora tenho um primo em Saturno
bebendo à saúde dos esquimós
e fazendo a apologia das focas e do último mamute morto na Sibéria

Amanhã por entre os cabelos do sol jantarei o teu corpo sobre o gelo
num sítio onde as morsas costumam brincar aos sexos trocados
e talvez a brisa me traga notícias de Gengiscão
e da primeira virgem sueca que se envenenou com arsénico
Rapariga na Gronelândia no gelo sentada
fazendo contas às veias e sabendo que as pernas esbeltas cheirando a Maio
fazem bem ao nariz e aos olhos dos adolescentes

E quando estiver a jantar o teu corpo sobre o gelo
haverá música por dentro dos esquimós
e talvez se lembrem de pôr nos dentes
a primeira palavra que esteve na boca do povo
quando as crianças sorriam sem saber da existência das facas
E de piroga desceremos de rio em rio os dentes no busto marcados
à procura de outra música que vem das estepes
e nos fala de Borodine e dos pés grandes do Príncipe Igor

Então subimos de música no peito e nem a tua língua pára
e nem as minhas mãos perdem o calor das tuas pernas
rapariga na Gronelândia no gelo sentada
na última aldeia de todas a mais triste e fria
precisamente onde a Gronelândia acaba
onde os seios ficam mais pequenos sempre
rapariga torcida de neve cheia de vento e de esperma
recitando nos meus lábios a história do primeiro viking

E jantado o teu corpo sobre o gelo as veias regressando ao dó menor
haverá música de cabana em cabana e no largo X onde as crianças acordam de nervos na mão
sobre os meus ombros sentirei o bafo de Mokrousov
rapariga sentada na neve o corpo torcido
na última aldeia a mais triste e fria de todas
onde a Gronelândia acaba e os seios ficam sempre pequenos
ó moça boreal tudo em ti foge para os meus músculos
precisamente na hora em que os esquimós aprendem a fazer amor

E de gesto em gesto entro na tua carne perdida na Gronelândia
na aldeia mais triste e fria de todas
onde a Gronelândia acaba e os seios ficam sempre mais pequenos
rapariga sentada no gelo torcida de neve
e desço sobre ti ao fundo de todos os sonhos e todas as pernas
ó ventre guloso perdido entre os icebergues
onde Mokrousov cantando sorrindo atravessa o mar
e enrola-se nos teus cabelos para te dizer
que "Tu estás sempre bonita"
Mais uma poesia de Sombras luminosas:




Blasfémia


Hoje, particularmente hoje,
sinto-me vocacionado para a blasfémia:
Onde está o meu sentimento de um ocidental?
Se todos os caminhos me afastam do Cabo da Roca?
Eu não disse que ia para Santiago,
apenas declaro que que a céltica hora morreu
como se a Galiza ficasse de súbito
a Ocidente do sentimento


António Eduardo Lico