sexta-feira, 31 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Aos poetas que procuram o Graal


Não invejo os poetas que buscam o Graal
nem os que procuram as vírgulas
que não se escrevem.
As palavras são mais lendárias
que todos os Graal, excepto o Graal.
Eu não procuro o Graal; sei que ele
existe na sua não existência.

Ele, o Graal,
plácido como convém a um Graal,
não espera visitas de poetas.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Luís Amorim de Sousa:

O Velho no Parque

é por inconformismo 
que venho aqui sentar-me
neste parque mais velho do que eu

há um raio de sol que me conhece
e vem lamber-me as mãos quando
me vê

de resto não suporto este verde molhado
este romper de brancos e amarelos

sei de memória as vozes quotidianas
e atento aguardo a noite
que as sossega

a minha noite
pássaro sem asas
onde abrigar a célere cabeça

os meus navios afundei-os todos
ante um luar puríssimo humilhado

ó meu país
ó mapa desdobrado sobre a areia
não sei porque te invoco ó sepultura
aberta e saqueada

existes só no espaço em que te habito
aqui
numa praia distante entre as rochas e conchas
que me ferem os pés e me fazem sofrer

invoco-te e és real medonho e
impossível

ó flâmula hasteada
ó marinheiro triste nos porões

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Poema do colibri que morreu entre flores

(Dedicado à Antonia Penhalver)

Tinhas como sonho as flores,
tu colorido colibri que tantas vezes
perfumaste o invisível ar que te sustentava
com inesperados néctares.
O silêncio em que agora voas
bate as asas como se fora flor.

António Eduardo Lico
Uma poesia the Rudyard Kipling:

The Mother-Logdge

There was Rundle, Station Master,
An' Beazeley of the Rail,
An' 'Ackman, Commissariat,
An' Donkin' o' the Jail;
An' Blake, Conductor-Sargent,
Our Master twice was 'e,
With 'im that kept the Europe-shop,
Old Framjee Eduljee.

Outside -- "Sergeant! Sir! Salute! Salaam!"
Inside -- "Brother", an' it doesn't do no 'arm.
We met upon the Level an' we parted on the Square,
An' I was Junior Deacon in my Mother-Lodge out there!

We'd Bola Nath, Accountant,
An' Saul the Aden Jew,
An' Din Mohammed, draughtsman
Of the Survey Office too;
There was Babu Chuckerbutty,
An' Amir Singh the Sikh,
An' Castro from the fittin'-sheds,
The Roman Catholick!

We 'adn't good regalia,
An' our Lodge was old an' bare,
But we knew the Ancient Landmarks,
An' we kep' 'em to a hair;
An' lookin' on it backwards
It often strikes me thus,
There ain't such things as infidels,
Excep', per'aps, it's us.

For monthly, after Labour,
We'd all sit down and smoke
(We dursn't give no banquits,
Lest a Brother's caste were broke),
An' man on man got talkin'
Religion an' the rest,
An' every man comparin'
Of the God 'e knew the best.

So man on man got talkin',
An' not a Brother stirred
Till mornin' waked the parrots
An' that dam' brain-fever-bird;
We'd say 'twas 'ighly curious,
An' we'd all ride 'ome to bed,
With Mo'ammed, God, an' Shiva
Changin' pickets in our 'ead.

Full oft on Guv'ment service
This rovin' foot 'ath pressed,
An' bore fraternal greetin's
To the Lodges east an' west,
Accordin' as commanded
From Kohat to Singapore,
But I wish that I might see them
In my Mother-Lodge once more!

I wish that I might see them,
My Brethren black an' brown,
With the trichies smellin' pleasant
An' the hog-darn passin' down;
An' the old khansamah snorin'
On the bottle-khana floor,
Like a Master in good standing
With my Mother-Lodge once more!

Outside -- "Sergeant! Sir! Salute! Salaam!"
Inside -- "Brother", an' it doesn't do no 'arm.
We met upon the Level an' we parted on the Square,
An' I was Junior Deacon in my Mother-Lodge out there!

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Epur si muove

Gira, de amor se colhem frutos,
a roda que os Fados movem,
dignos dos mais olímpicos deuses;
vão-se os frutos com a roda
e os Fados são quem vencem.

António Eduardo Lico
Duas estrofes do Canto IX dos Lusíadas e que se refere à Ilha dos Amores:



De ũa os cabelos de ouro o vento leva,
Correndo, e da outra as fraldas delicadas;
Acende-se o desejo, que se ceva
Nas alves carnes, súbito mostradas.
Ũa de indústria cai, e já releva,
Com mostras mais macias que indinadas,
Que sobre ela, empecendo, também caia
Quem a seguiu pela arenosa praia.


Outros, por outra parte, vão topar
Com as Deusas despidas, que se lavam;
Elas começam súbito a gritar,
Como que assalto tal não esperavam;
Ũas, fingindo menos estimar
A vergonha que a força, se lançavam
Nuas por entre o mato, aos olhos dando
O que às mãos cobiçosas vão negando;

terça-feira, 28 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Soneto sem Musa


Eram claros esses teus olhos cheios
De onde manam luzes como fontes
Como alegria vinda dos montes
Que forma frescos e mansos ribeiros

Dos meus olhos sempre foram alheios
De presos em distantes horizontes,
Juízes não eleitos, mas arcontes.
Como rosas brincando de luzeiros

Musa não eras, mesmo que te cante
E os teus olhos tinham doces rosas
Como se a luz fora diamante

Rosas tinham, eu sei, mas angulosas.
Claras, e de perfume tão distante,
Frescas fontes, águas tão amargosas.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Vidal, Jogral de Elvas. Transcrição para português moderno de Natália Correia:

Formosinha de Elvas

Faz-me por ela morrer
e traz-me desesperado
alguém que dá gosto ver
e de corpo bem talhado,
por quem a morte hei-de ter
como cervo lanceado
que se vai do mundo a perder
da companhia das cervas.

Antes ficasse sandeu
ou me embruxassem com ervas
no dia em que me apareceu
a tal formosinha de Elvas.

Mais a morte me convém,
pois da sensatez me queixo
de quem desejo não tem
de matar o meu desejo
e me parece tão bem
que cada vez que a vejo
me lembra a rosa que vem
saindo por entre as relvas.

Antes ficasse sandeu
ou me embruxassem com ervas
no dia em que me apareceu
a tal formosinha de Elvas.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:

Vou-me embora para Parságada
Lá sou amigo do rei...
(Manuel Bandeira)

Vou-me embora para Lisboa

Vou-me embora para Lisboa.
Lisboa é filha do Tejo
e eu sou filho das ondas,
filho das ondas do mar,
filho do sopro do vento.
Vou-me embora para Lisboa.
Lisboa tende para o azul,
o Tejo e o mar encontram-se
percorrendo Lisboa;
o Tejo com vontade
de partir para longe,
o mar com vontade
de visitar os segredos de Ulisses.
Vou-me embora para Lisboa.
Lá tem uma viela
onde o azul é mais azul
e posso ter todas as princesas mouras
que eu quiser, e ouvir o canto
dolente das guitarras.
Vou-me embora para Lisboa.
Vou ver-te olhar o cais
vou ver o Tejo afogar-se,
azul, no mar todo.

António Eduardo Lico

Uma poesia de Mallarmé. Este soneto, tem por convenção o título de Sonnet en x, devido à existência de rimas que contêm esta letra:

Sonnet en X


Ses purs ongles très haut dédiant leur onyx,
L’Angoisse, ce minuit, soutient, lampadophore,
Maint rêve vespéral brûlé par le Phénix
Que ne recueille pas de cinéraire amphore

Sur les crédences, au salon vide : nul ptyx,
Aboli bibelot d’inanité sonore,
(Car le Maître est allé puiser des pleurs au Styx
Avec ce seul objet dont le Néant s’honore.)

Mais proche la croisée au nord vacante, un or
Agonise selon peut-être le décor
Des licornes ruant du feu contre une nixe,

Elle, défunte nue en le miroir, encor
Que, dans l’oubli fermé par le cadre, se fixe
De scintillations sitôt le septuor.

domingo, 26 de maio de 2013

Aconteceu-me uma poesia estta manhã. Ficará integrada no poemário Este rio que corre sem águas:

Ventre da noite, com grilos


O ventre da noite expulsa poléns
e grilos violeta olham uma lua
que inunda os horizontes.

que versos são estes?
A noite tem tem um ventre!
A noite tem ventre.
Como um artigo indefinido
pode estragar tudo!

a gramática e a morfologia
deviam ser violeta
e inundar horizontes,
E se possível tanger liras
desmesuradas.

António Eduardo Lico
Uma poesia de José Tolentino de Mendonça:


Apenas um cigarro

As palavras são as mesmas
mas deixei de saber o tempo
para chegar a ti
durante meses e meses
tinha perdido o hábito
as histórias que de noite sonhas
o evidente esplendor que depois
não tomou nenhuma forma


que a razão é a deste amor
que tanto se confunde
com o medo


não dizias nada
tinhas de repente uma pressa desesperada
como quem do mundo inteiro
pretendesse apenas
um cigarro

sábado, 25 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Este rio que descubro em mim

Este rio que descubro em mim
não sei em que fontes nasceu.
É de melancolia a frescura
desta água, e deste rio
que me mata a sede
e põe navios no teu riso.
Será de espanto esta torrente
que me enche e me esvazia
e não sei em que fontes nasceu
este rio que descubro em mim.

António Eduardo Lico
Uma poesia de José Augusto Mourão.
Tive a sorte de poder contar com a sua amizade. Faleceu, indelizmente dia 5 de Maio de 2013:

apocalipse

virei
reiteradamente
como as estações das flores
virei como o animal ou o corsário
semear o vento que vos lembre a morte
(e vós que vos fechais em vossa vã imagem e vossos trapos,
vós que adorais Deus olhando-vos ao espelho,
tremei de vosso assento de carne fustigada
há muito que Ele deixou às vossas portas as sandálias)
virei na eclosão das vagas
envolto em tudo quanto a vida trabalha
virei no desregramento do vento
e em vosso pasmo
assim eu cante o vinho
que sobe o rio às costas dos vindimadores
virei no circuito da palavra
que se quebra como um ramo de água
e deixareis as armas para falar sem ritos
morre-se quando de nós ficam ficaram restos
que ninguém recolhe
virei no som de Stockhausen
e quantos desconstruíram a harmonia
e o mundo antigo
para que habiteis o tempo
como quem habita as fontes
cheios de barulhos por dentro
como o vinho
à cabeça das vindimadeiras




sexta-feira, 24 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemaŕio O canto em mim:


Leva-me o vento...

Leva-me o vento, brandamente,
como se empurrasse as velas
de um veleiro.
Deixo-me levar, porque quero,
a geografia não me interessa,
nem os mapas do meu ser
se podem cartografar.
Leva-me o vento, brandamente,
e nada faço, a não ser deixar-me levar.
Nada sei da rosa dos ventos,
sei apenas das rosas, essas,
a que o vento acaricia brandamente.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Casimiro de Brito:

Meus pensamentos são nómadas

Meus pensamentos são nómadas
e vagarosos

como a água que vem da montanha
e não sabe nada

do coração dos homens.
O meu, por exemplo,
tem a leveza do vento

e corre para casa como se fosse
um cão que precede
os passos do dono.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Este chão que piso

Este chão que piso, sustenta-me
e é a minha pequena pátria.
Este chão que piso
é onde os meus pés pisam.
Movo-me com cuidado
e quando me ausento
deste chão que piso, tenho saudades.
Regresso onde os meus pés pisam
e sei que estou na minha pequena pátria.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Luíza Neto Jorge:



A CASA DO MUNDO


Aquilo que às vezes parece
um sinal no rosto
é a casa do mundo
é um armário poderoso
com tecidos sanguíneos guardados
e a sua tribo de portas sensíveis.

Cheira a teias eróticas. Arca delirante
arca sobre o cheiro a mar de amar.

Mar fresco. Muros romanos. Toda a música.
O corredor lembra uma corda suspensa entre
os Pirinéus, as janelas entre faces gregas.
Janelas que cheiram ao ar de fora
à núpcia do ar com a casa ardente.



Luzindo cheguei à porta.
interrompo os objetos de família, atiro-lhes
a porta
Acendo os interruptores, acendo a interrupção,
as novas paisagens têm cabeça, a luz
é uma pintura clara, mais claramente me lembro:
uma porta, um armário, aquela casa.

Um espelho verde de face oval
é que parece uma lata de conservas dilatada
com um tubarão a revirar-se no estômago
no fígado, nos rins, nos tecidos sangúíneos.
É a casa do mundo:
desaparece em seguida:

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Reponho uma poesia o poemário O canto em mim:


O gato é um tigre melancólico

Um gato é um tigre melancólico.
Contenta-se em ser apenas gato,
com artifícios no olhar
e filosofia no corpo lânguido.
Caminhando vagarosamente
na beira do telhado, entre
chão e nuvens, quase rente ao voo,
é apenas um gato.
Nós é que gostamos de o imaginar
como se fora um tigre melancólico.

António Eduardo Lico
Uma poesia do poeta Namibiano Ferreira. O endereço do seu blog: http://poesiangolana.blogspot.co.uk/

Relendo Viriato da Cruz nos campos de Norfolk

Quase todos os dia chove.
O sol não se dilui na face
dos nossos desejos.
Aqui, cada dia mais a Norte,
a luz de Inglaterra
é a infinita verdura espalhada
pelos campos do Norfolk
às vezes cerceados pelo manto
das vestes outonais
e o verde do Norfolk é uma sede
na aridez do meu deserto...


E o que sei de mim
está no suspenso da tarde
- agonia cinzenta -
onde caminho relendo
os poemas do Viriato.
Os poemas choram
no assobio triste
deste vento outonal
e os poemas do Viriato
já não são em si mesmos
o Viriato na pessoa
de sua voz.
E por entre uivos
do silêncio tagarela
tudo se perde
na voracidade verde
que não satisfaz
a clorofila tropical
da minha alma.

terça-feira, 21 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


De noite a lenha arde obscura

De súbito, era tudo noite
e o silêncio ardeu
como obscura lenha.
De súbito, era tudo silêncio
e a noite ardeu
como obscura lenha.
E era apenas noite e silêncio
e lenha que ardia, obscura.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Eugénio de Andrade:


As palavras

São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.
Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.
Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.
Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Te quisera verde

Queria-te como o trigo
ondulando, verde, ao longe,
como uma melodia.
Queria-te como o vento
Que ondula o trigo,
ao longe, como uma melodia.
Queria-te verde. Como a melodia
entoada pelo trigo, que ondula,
ao longe, embalado pelo vento.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Sophia de Mello Breyner Andresen:


CANTATA DA PAZ

Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar
Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar

Vemos, ouvimos e lemos
Relatórios da fome
O caminho da injustiça
A linguagem do terror

A bomba de Hiroshima
Vergonha de nós todos
Reduziu a cinzas
A carne das crianças

D'África e Vietname
Sobe a lamentação
Dos povos destruídos
Dos povos destroçados

Nada pode apagar
O concerto dos gritos
O nosso tempo é
Pecado organizado

domingo, 19 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Flor que brilhas no jardim

Flor que brilhas no jardim
é breve o teu perfume;
a cor que te acaricia
as pétalas é fugaz.
Olho-te, e sei que a vida
te será breve.
Não sou filósofo, nem metafísico
nem sei porque me sento num jardim.
Sei-te breve, flor que brilhas no jardim,
o teu perfume me alimentará
e o instante será breve.
A tua seiva quente penetrará a terra.
Não sei porque me sento num jardim.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Fernando Guimarães:

Post Coitum Animal Triste

Em ti o poema, o amplo tecido da água ou a forma
do segredo. Outrora conheceste a margem abandonada
do desejo, a sua extensão e principias a entregar
os vasos alongados para receberes as mãos das chuvas.

Apagaram-se junto dos teus olhos as praias, as árvores
que se ergueram um dia sobre as estradas romanas,
o vestígio dos últimos peregrinos, aves nuas
que já desceram, cansadas, pelo interior do teu peito.

Uma voz, no silêncio calmo das águas, esquece
a mentira das primeiras colheitas, onde os nossos gestos
perderam os sorrisos ou o orvalho que os cerca.

Serenamente, começaram a fechar-se os sonhos de Deus
no interior de novos frutos e, abandonado, fico
junto do teu corpo, onde principia a sombra deste poema.

sábado, 18 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


De Eros era a rosa

De Eros era a rosa
que em Prometeu
foi Fogo e limo.
depois centelha de vida.
Seria já rosa
o que Pandora
escondia na caixa divina?
Da rosa apenas ficou
a esperança encerrada;
a caixa fechou-se.
Prometeu, eternamente
devorado, e sempre renascido
como o lume que se reacende
e torna fresca a eterna rosa.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Celso Emilio Ferreiro:


DEITADO FRENTE AO MAR…

Lingoa proletaria do meu pobo
eu faloa por que sí, porque me gosta,
porque me peta e quero e dame a gaña
porque me sai de dentro, alá do fondo
de unha tristura aceda que me abrangue
ao ver tantos patufos desleigados,
pequenos mequetrefes sin raíces
que ao pór a garabata xa non saben
afirmarse no amor dos devanceiros,
falar a fala nai,
a fala dos abós que temos mortos,
e ser, co rostro erguido,
mariñeiros. labregos do lingoaxe,
remo i arado, proa e rella sempre.

Eu fáloa porque sí, porque me gosta
e quero estar cos meus, coa xente miña,
perto dos homes bós que sofren longo
unha historia contada em outra lingoa.

Non falo pra os soberbios,
non falo pra os ruís e poderosos,
non falo pra os estúpidos,
non falo pra os valeiros,
que falo pra os que agoantan rexamente
mentiras e inxusticias de cotío;
pra os que súan e choran
un pranto cotidián de volvoretas,
de lume e vento sobre os ollos núos.
Eu non podo arredar as miñas verbas
de todos os que sofren neste mundo.
E ti vives no mundo, terra miña,
berce da miña estirpe,
Galicia, doce mágoa das Españas,
deitada frente ao mar, ise camiño…

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Despertai deuses antigos

Oh deuses antigos, despertai
do vosso olímpico sono,
vinde à Terra das Laranjas
e trazei o sagrado mosto
das antigas libações.
Oh deuses antigos, vinde,
vinde à Terra das Laranjas,
trazei o sopro antigo
que do mosto fazia o vinho
e tornava as profecias
em eternas melodias.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Jorge de Sena:


Dizia uma vez Aquilino...

Dizia uma vez Aquilino que em Portugal
os filósofos se exilavam ainda em seu país
(v.g. Spinoza). O curioso porém
é que também ninguém foi santo lá:
os nascidos em Portugal foram todos sê-lo noutra parte
(St. António, S. João de Deus, etc.)
e outros santos portugueses, se o foram,
terá sido, porque, estrangeiros que eram e em Portugal
vivendo, não tiveram outro remédio
(v.g. Rainha Santa) senão ser santos,
à falta de melhor. Oh país danado.
Porque os heróis também nunca tiveram melhor sorte
(Albuquerque e outros que o digam) a menos que
tivessem participado de revoluções feitas
*em vez de* (v.g. o Condestável que fez 
fortuna e a casa de Bragança e acabou só Santo quase).

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário Que de dentro não se vê:


Poesia imaginada e enigmática

O enigma que me veste
canta com muitas vozes
o espanto com que me fito.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Federico Garcia Lorca:

Mi Niña se Fue a la Mar

Mi niña se fue a la mar,
a contar olas y chinas,
pero se encontró, de pronto,
con el río de Sevilla.

Entre adelfas y campanas
cinco barcos se mecían,
con los remos en el agua
y las velas en la brisa.

¿Quién mira dentro la torre
enjaezada, de Sevilla?
Cinco voces contestaban
redondas como sortijas.

El cielo monta gallardo
al río, de orilla a orilla.
En el aire sonrosado,
cinco anillos se mecían.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


La Tristesse est triste

La tristesse est plus triste
quand le Printemps habille
de vert tes yeux, et le vent
fait naître des hirondelles,
ces roses tristes
qui parfument l’air,
et peignent tes cheveaux
de melodies secrètes.

António Eduardo Lico
Uma poesia de José Blanc de Portugal:

Ode a Lisboa

Ó cidade, ó miséria
Ó tudo que entediava
Meus dias perdidos no teu ventre
Ó tristeza, ó mesquinhez cativa
Ó perdidos passos meus cansados
Ó noites sem noite nem dia
Ó dias iguais às noites
Sem esperança de outros melhor haver
Ou, pior, esperando alguém que não havia
Ó cidade, ó meus amigos idos
(tive-os eu ao menos como tal um dia dia?)
Ó cansaço de tudo igual a chuva e o céu azul imenso
Igual em toda a volta, meses de calor,
Ou água suspensa, nuvens indistintas
Ou cordas de chuva a não poupar-me!
Igual, igual, igual por toda a banda
Ó miséria de sempre!
Tua miséria, ó cidade
Minha miséria igual em tudo
Igual às tuas ruas cheias
Igual às tuas ruas desertas
Igual às tuas ruas de dia
Igual às tuas ruas de noite
Igual à dos teus grandes
E das tuas prostitutas
Igual às dos teus homens corrompidos
E,
piormente igual à dos teus sábios!

Ó cidade igual inigualada
Por que te chamo perdidamente igual?

Tua miséria não é miséria,
Tua tristeza não é tristeza
Tudo que me perdeste para ti não é perdido:
Meus passos firmaram-te as pedras;
Tuas noites foram o meu sol;
Teus dias me foram descanso...
Iguais, dias, noites, minha desesperança
Era o próprio esperar doutras certezas:
A certeza de só poder tornar-se
O alguém que é forçoso haver!

Os meus amigos idos
Por tal seriam por certo perdidos
Sei — como não? que existiram:
Lá estão.

Ó cidade! o cansaço seguiu-me
— não era teu.
Igual o tempo está comigo
— não era teu...
Igual, igual, igual por toda a banda. . .
A miséria, o desalento aqui os tenho
— Também não eram teus.

Mas a gente era tua e eu também.
Lá ficou; e eu,
Ó cidade, ó miséria,
Ó tudo que me entediava,
Meus dias perdidos no teu ventre!...
Sei que nada me pertence
É tudo teu!
E eu me glorifico por eu e os meus
Sermos só de ti que és de Deus!

terça-feira, 14 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Marítima


En la orilla, esa que lle llaman, de la mar
las arenas son el testigo antiguo
de noches y luna naciendo en tu seno.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Eduardo Pitta:

Agora que as Palavras Secaram

Agora que as palavras secaram
e se fez noite
entre nós dois,
agora que ambos sabemos
da irreversibilidade
do tempo perdido,
resta-nos este poema de amor e solidão.

No mais é o recalcitrar dos dias,
perseguindo-nos, impiedosos,
com relógios,
pessoas,
paredes demasiado cinzentas,
todas as coisas inevitavelmente
lógicas.

Que a nossa nem sequer foi uma história
diferente.
A originalidade estava toda na pólvora
dos obuses, no circunstanciado
afivelar
dos sorrisos à nossa volta
e no arcaísmo da viela onde fazíamos amor.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Em Lisboa a claridade é azul

Canto-te Lisboa
e quero-te azul,
como quando o Tejo
é o azul do teu céu.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Hélia Correia:



Que o poema tenha carne
ossos vísceras destino
que seja pedra e alarme
ou mãos sujas de menino.
Que venha corpo e amante
e de amante seja irmão
que seja urgente e instante
como um instante de pão.

Só assim será poema
só assim terá razão
só assim te vale a pena
passá-lo de mão em mão.

Que seja rua ou ternura
tempestade ou manhã clara
seja arado e aventura
fábrica terra e seara.
Que traga rugas e vinho
berços máquinas luar
que faça um barco de pinho
e deite as armas ao mar.

Só assim será poema
só assim terá razão
só assim te vale a pena
passá-lo de mão em mão.

domingo, 12 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Entre a Claridade e a sombra…a rosa

Era clara a obscuridade
que habitava, fria,
a sombra dos teus olhos.
Uma brusca rosa
nascia-te nos cabelos.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Álvaro Alves de Faria:

Verso e reverso

Estão comprometidos com o sangue
o verso e o reverso desta medalha:
desfaz-se em palavras
o tempo de esperar tempo melhor
faz-se com nosso fôlego e nossa força
não importa morrer
veneno que brilhou no espaço
importa abrir a raiz
a dor de uma bala atravessando o cérebro
sem mais nenhuma palavra a dizer.

sábado, 11 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


In the silence there is a rose

Sometimes, when your eyes find my eyes
your enigmatic silence
is as if you were asking me – what is a rose?
I close my eyes and seal my lips
and the rose is between our silence.

António Eduardo Lico
Uma poesia de David Mourão-Ferreira:


Primavera

Todo o amor que nos
prendera
como se fora de cera
se quebrava e desfazia
ai funesta primavera
quem me dera, quem nos dera
ter morrido nesse dia
E condenaram-me a tanto
viver comigo meu pranto
viver, viver e sem ti
vivendo sem no entanto
eu me esquecer desse encanto
que nesse dia perdi
Pão duro da solidão
é somente o que nos dão
o que nos dão a comer
que importa que o coração
diga que sim ou que não
se continua a viver
Todo o amor que nos
prendera
se quebrara e desfizera
em pavor se convertia
ninguém fale em primavera
quem me dera, quem nos dera
ter morrido nesse dia

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Que este olhar não me vê

Oculto-me na multidão
e vejo-me passar ao longe.
Fito-me como se fosse estranho.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Décio Pignatari:

Eupoema

O lugar onde eu nasci nasceu-me
num interstício de marfim,
entre a clareza do início
e a celeuma do fim.

Eu jamais soube ler: meu olhar
de errata a penas deslinda as feias
fauces dos grifos e se refrata:
onde se lê leia-se.

Eu não sou quem escreve,
mas sim o que escrevo:
Algures Alguém
são ecos do enlevo.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Poema para qualquer mulher

A vida desenhou-te
eterna efeméride no rosto,
ocultou nos teus olhos o feitiço da lua
e deu aos teus lábios
o sabor de todos os frutos

António Eduardo Lico
Uma poesia de Ruy Vasconcelos:

ARAME

sob as vírgulas
o peixe filtrado pelo
olho envolto no verde
exceto abaixo
onde seixos
calam fundo

mas o espectro
argento do peixe
em vago rastro
até os seixos
move uma farpa
que não cessa

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Le silence d’une rose

Comme si tous les parfums
habitaient tes lèvres,
le silence a fermé ta bouche
comme une rose

António Eduardo Lico
Uma poesia de Rui Knopfli:

Cair do pano

As acácias já se incendiaram de vermelho
e o zumbido das cigarras enxameia obsidiante
a manhã de Dezembro. A terra exala,
em haustos longos, o aguaceiro da madrugada.
Ao longe, no extremo distante da caixa

de areia, o monhé das cobras enrola
a esteira e leva o cesto à cabeça,
cumprido o papel exacto que lhe coube
e executou com paciente sageza hindu.
Dura um instante no trémulo contraluz

do lume a que se acolhe, antes da sombra
derradeira. Assim, os comparsas convocados
para esta comédia a abandonam, verso
a verso, consignando-a ao olvido
e à erva daninha que, persistente, a cobrirá

irremediavelmente. O encenador faz
a vénia da praxe e, porque aplausos
lhe não são devidos, esgueira-se pelo
anonimato da esquerda alta. É Dezembro
a encurtar o tempo, o pouco que nos sobra.

terça-feira, 7 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Elegia para uma flor morta

A obscura flor morta
pensa ainda no seu perfume
quando os insectos
procuram nas suas pétalas mortas
a fragrância que a animou.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Mário Chamie:

QUEDA INTERIOR

Se a queda é livre
o medo da queda
é preso.

Livre é a queda
sem embaraço
defeso.

A queda
de um homem
tenso
não é a guerra
do Peloponeso
pelo estreito
de um coração
perverso.

A queda
livre
é o próprio peso
de um coração
suspenso.

Toda queda
é o menosprezo
de quem cai
sobre si mesmo.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


O azul do céu azul

O azul do céu é azul
quando o céu é azul.
Quando o céu não é azul
o azul do céu não é azul.
O azul do céu quando
o Céu é azul não é bom
para os filósofos;
é só azul, sem filosofias;
e de metafísica
apenas existe a vaga
noção que tenho do azul
do céu, quando é azul.

António Eduardo Lico
Uma poesia de José Tolentino Mendonça:

ISTO É O MEU CORPO

O corpo tem degraus, todos eles inclinados
milhares de lembranças do que lhe aconteceu
tem filiação, geometria
um desabamento que começa do avesso
e formas que ninguém ouve

O corpo nunca é o mesmo
ainda quando se repete:
de onde vem este braço que toca no outro,
de onde vêm estas pernas entrelaçadas
como alcanço este pé que coloco adiante?

Não aprendo com o corpo a levantar-me,
aprendo a cair e a perguntar

domingo, 5 de maio de 2013

"Minha Mãe" tema popular cantado por José Afonso.



Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Esta abrupta sede

Brusca e abrupta sede
me prende em atmosferas
de húmidas paisagens
que desenho e canto
no vértice da tua ausência

António Eduardo Lico
Para além de tudo o que é mais curial conhecer-se de Bertold Breeht, este deixou um enorme acrevo de poesia erótica, ou mesmo para além do erótico, de que é exemplo a poesia que hoje deixo com tradução de Aires Graça:

Da sedução dos anjos

Anjos seduzem-se: nunca ou a matar.
Puxa-o só para dentro de casa e mete-
-Lhe a língua na boca e os dedos sem frete
Por baixo da saia até se molhar

Vira-o contra a parede, ergue-lhe a saia
E fode-o. Se gemer, algo crispado
Segura-o bem, fá-lo vir-se em dobrado
P'ra que do choque no fim te não caia.

Exorta-o a que agite bem o cu
Manda-o tocar-te os guizos atrevido
Diz que ousar na queda lhe é permitido
Desde que entre o céu e a terra flutue –

Mas não o olhes na cara enquanto fodes
E as asas, rapaz, não lhas amarrotes.

sábado, 4 de maio de 2013

Canção do mar - José Afonso


Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Esta mensagem que me chega

Eis como tudo começa:
de Hermes recebi a mensagem
que já me estava destinada

Recebo-a com a indiferença
gelada dos que não esperam.
Os deuses já conhecem todas
as mensagens e Hermes
é apenas o velado mensageiro.

António Eduardo Lico
Uma poesia de Nuno Dempster:

MANHÃ

Serena manhã, sol em que os cedros avultam
a sua eternidade. Carros passam na rua
como se não levassem ninguém no interior,
e nada mais espero do que sentir ainda
a blandícia da luz, pele em meus dedos cálida,
um rosto que celebro, a substância dos cedros
que flui branda num corpo, segredos do silêncio
donde a sabedoria de ser-se inteiro emana.
Oh, o tranquilo sol de uma manhã de inverno
que me lembra tão longas mãos! Devo pensar
na árvore sem folhas que vejo da janela,
imitar-lhe a existência sem tempo nem saber
como os cedros demonstram a sua eternidade,
receber este sol, seguro de que os deuses
só na era de Posídon seriam verdadeiros.
As quatro estações limitam-me, e as ilhas
que flutuavam no azul Egeu não mais existem.
Limitam, mas libertam-me as quatro estações,
e assim, o meu inverno, esta manhã sucinta
dilui-me na paisagem com a lembrança doce
de que a luz é o Sol, e aquelas longas mãos
volvem a antigos deuses as ilhas irreais.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


A Esfinge de ébano

Da esfinge de ébano,
a dos doces lábios
colhi apenas
amarga flor de silêncio

António Eduardo Lico
Uma poesia do poeta filipino Edwin Agustín Lozada:

Socorro

Oh poeta, ven, te pido socorro.
Aclárame este dolor que yo siento.
Yo no sé si es azul, violeta o púrpura,
si viene, ay, de las noches perdidas,
espesas y ahogadas en el profundo
mar que atormenta mi paz temerosa,
frágil, tan inestable y angustiada,
o si viene del viento sanguinario
de la cruel verdad que me sigue espiando,
pero no se muestra y no me confiesa
lo que oculta, guarda y calla en sus ojos
negros, opacos, fríos, solitarios.

Poeta, profeta de los corazones,
mago que del caos de los sentimientos
plasmas y das vida a lo fugitivo,
a lo incomprensible y a lo confuso
con tus palabras, luciérnagas que
dan señales de vida y esperanza,
belleza y alegría, claridad
donde ha desaparecido la luz
volátil que tanto nos hace falta.
¡Poeta, consuélame con tus luciérnagas,
pequeñas estrellas, tan delicadas,
pero en mi alma, potentes como el sol!

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


Fragmento para uma poesia

Afrodite nascia da água
e uma rosa era o silêncio
futuro que Eros havia de fazer

António Eduardo Lico
Uma poesia de Afonso Lopes Vieira:


Saudades de Portugal

1

Nunca como em Veneza
adoro a nossa pobreza
portuguesa;
as nossas casas caiadas,
as nossas praias salgadas,
os burricos berberes,
e na Batalha de pedras douradas
a saia pela cabeça das mulheres.

Ó Veneza oriental,
marítimo tesouro
de púrpura, de mármores e de ouro:
- em Portugal
rico só é o ceu que nos lá cobre.
Portugal teve o mundo - e ficou pobre.


2

Aquele romantismo de Veneza
ah! não, não acabou
enquanto um ruivo sol de dogareza
o Canal Grande todo iluminou.

Sirenetta d´Annunzio cobiçava
certa gôndola em flor;
e a sombra de Musset, no Danieli, lembrava
as cruezas de George, o amor e a dor.

Mas à varanda deste albergo Real
(diz lá, Poesia: onde é que moras tu?)
um hóspede contempla a luz ideal
sentado em almofada de cautchú.


3

Este lugar Anfitrite,
com seu capitão de Ílhavo,
que leva gasolina
a portos da Moirama
e às correntes mais vivas se abandona,
quanto mais me diverte
que o Roma e o Cap Arona!

Vamos na intimidade
do mar, com quem podemos conversar...
- Ó palaces horríveis p´ra viajar!
Coqueteiles de horror! Cadáveres pintados!
Banqueiros! Espiões de todos os Estados! -
Aqui vivo na tolda e ando salgado,
livre do mau-olhado,
e durmo sono fundo
sob as estrelas, té que rompa o dia.
Neste nosso veleiro
poderíamos dar a volta ao mundo
porque ia connosco a Ria
de Aveiro!...


4

Lavrador do Chão,
se semeio trigo
choro-me comigo
e não colho pão.

E se planto vinha
e trato o que planto,
que miséria a minha,
o meu vinho é pranto.

Lavrador do mar,
se semeio espuma
colho e ceifo bruma,
ponho-me a cantar!

Ó seara de vagas
em que os olhos ponho,
que bem que me pagas
em moeda de sonho!...

quarta-feira, 1 de maio de 2013

Reponho uma poesia do poemário O canto em mim:


A palavra das rosas

Dai-me uma, duas palavras
com que escreva uma rosa no teu sorriso

António Eduardo Lico
Uma poesia de Vladimir Maiakovski:

Meu Maio

A todos
Que saíram às ruas
De corpo-máquina cansado,
A todos
Que imploram feriado
Às costas que a terra extenua –
Primeiro de Maio!
Meu mundo, em primaveras,
Derrete a neve com sol gaio.
Sou operário –
Este é o meu maio!
Sou camponês - Este é o meu mês.
Sou ferro –
Eis o maio que eu quero!
Sou terra –
O maio é minha era!