Uma poesia de António Pires Cabral:
DEFEITO DE FABRICO
Quando nasci, trazia de origem
um farol que despejava luz a jorros
sobre o que quer que fosse,
mormente sobre as dobras
pérfidas da noite.
Mas, por estranho que pareça,
também os faróis estão sujeitos
às leis da erosão,
e o meu farol deliu-se. Hoje não é
mais do que um triste farolim de bicicleta
que apenas me alumia dois palmos de noite.
Amanhã estará reduzido
a uma simples lanterna de bolso
com que mal poderei reconhecer
o lugar onde estou.
Até que um dia será, está bom de ver,
o mais fiável cúmplice da noite –
– da noite que devia dissipar,
e não fundir-se nela.
Defeito de fabrico.
Mas a garantia caducou e o fabricante
nega-se a ressarcir-me do escuro.
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