segunda-feira, 30 de julho de 2012

O poeta de hoje é Vitorino Nemésio.
Nascido em 1901nos Açores e falecido em 1978 em Lisboa, Vitorino Nemésio foi poeta, ficcionista e professor na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
Fica este poema:

Correspondência ao Mar

Quando penso no mar
A linha do horizonte é um fio de asas
E o corpo das águas é luar;

De puro esforço, as velas são memória
E o porto e as casas
Uma ruga de areia transitória.

Sinto a terra na força dos meus pulsos:
O mais mar, que o remo indica,
E o bombeado do céu cheio de astros avulsos.

Eu, ali, uma coisa imaginada
Que o eterno pica,
Vou na onda, de tempo carregada,

E desenrolo:
Sou movimento e terra delineada,
Impulso e sal de polo a polo.

Quando penso no mar, o mar regressa
A certa forma que só teve em mim -
Que onde ele acaba, o coração começa.

Começa pelo aro das estrelas
A compasso retido em mente pura
E avivado nos vidros das janelas.

Começa pelo peito das baías
Ao rosar-se e crescer na madrugada
Que lhe passa ao de leve as orlas frias.

E, de assim começar, é abstracto e imenso:
Frio como a evidência ponderada,
Quente como uma lágrima num lenço.

Coração começado pelos peixes,
É o golfo de todo o esquecimento
Na mínima lembrança que me deixas,

E a Rosa dos Ventos baralhada:
Meu coração , lágrima inchada,
Mais de metade pensamento.

Sem comentários:

Enviar um comentário