segunda-feira, 9 de abril de 2012

Mais duas poesias de Amanhecer obscuro:


Geografias

Escrevi uns versos em que falava
de oceanos tristes.
Os oceanos não são tristes; nem alegres.
São oceanos quando uns senhores
a que chamam geógrafos
decidem que são oceanos.
E decidem que são apenas oceanos; nem tristes, nem alegres.
Se eu escrevesse um verso assim:
“Oh taciturno Atlântico Oceano”.
Teria por certo exegetas, que iriam falar
de uma certa tendência classicista
nos meus versos; talvez até digam que eu estudei Latim...
Teria legiões de geógrafos a reclamarem
em cenáculos nacionais, internacionais e transnacionais
que de oceanos só eles podem falar.
Que nunca foi encontrado um oceano taciturno.
Eu não sou contra os geógrafos.
Devia haver muitos geógrafos. Milhões de geógrafos.
Tinham emprego garantido
A ensinar Geografia aos gringos.
O Mar Negro, é Mar Negro;
se fosse taciturno, ou fosse
outra coisa qualquer,
certamente estaria irritado com os geógrafos.
Os Mares também se irritam?
Porque é apenas Mar Negro
E não Oceano Negro?
Só os geógrafos o sabem.
Eu regresso à Água.


Secreta dorme no seu casulo...

Secreta, dorme no seu casulo
um sono suspenso, a crisálida.
Se Darwin te visse!
Se um criacionista, ou mesmo dois,
pudessem penetrar o teu sono!
Até um adepto de Lamarck
poderia investigar o teu caso!
Não queria falar em Lamarck...
Já sei que me vão falar em Lysenko.
Trofim Lysenko para ser quase exacto.
Tinha mais um nome, mas não vou usá-lo.
Quero apenas ser quase exacto.
A exactidão aprende-se, não está na genética.
É isso, Lysenko não queria a genética;
e detestou Mendel; Mendel apreciava ervilhas,
era austríaco, e sem o saber originou a genética:
é o que muitos afirmam; Mendel, nunca soube
que tinha fundado alguma coisa.
Os que dizem que fundou alguma coisa,
sem o saberem, ou os que depois
inventaram o termo GENÉTICA,
talvez apenas gostem de ervilhas!
Lysenko...não se sabe o que originou!
Pelo menos não o sabem os que o criticam
e apenas dizem que o malvado Lysenko
não queria a genética.
Lysenko não queria Mendel e não queria
ervilhas, nem flores de ervilhas
Indiferente aos meus versos,
aos que trucidam Lysenko em manuais
que apenas são conhecidos no corredor
do Departamento dos autores,
a crisálida dorme sem saber que dorme;
dorme um sono frio e distante.
Dorme e não sonha, nem sabe
que dorme para acordar para a luz.


António Eduardo Lico


Sem comentários:

Enviar um comentário